Há 12 anos, a Record investia em teledramaturgia e prometia incomodar a Globo com a produção de novelas. A meta em 2004 era ambiciosa: em poucos anos, ter três produções simultaneamente no ar, como a concorrente, e roubar dela a liderança de audiência. O que se projetava não se concretizou e, recentemente, a emissora mal consegue substituir o que vem sendo exibido, mesmo com a produção terceirizada.
Para por em prática o projeto ambicioso da Record, Edir Macedo comprou os estúdios de Renato Aragão em Vargem Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro, onde havia espaço para se produzir tantas novelas. O investimento, no entanto, começou a dar prejuízo já que, para o faturamento ser satisfatório, seria necessário ter três novelas simultâneas no ar - o que a Record efetivamente teve por pouco tempo, entre 2006 e 2007, quando colocou "Alta Estação", "Bicho do Mato" e "Cidadão Brasileiro". A audiência não satisfatória de "Alta Estação" fez o primeiro horário - entre 18h e 19h - ser abandonado.
"TV é hábito", já dizia José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, ex-vice-presidente da Globo, e essa é uma lição que a Record levou tempo demais para aprender. As mudanças de horários constantes atrapalham muito as novelas: "Cidadão Brasileiro" (2006) começou às 20h30 e com o tempo foi empurrada para as 22h. "Amor e Intrigas", que está sendo reprisada atualmente às 14h45, mudou de horário quatro (!) vezes durante sua exibição original, indo ao ar às 20h30, 21h25, 21h50 e 23h entre 2007 e 2008.
"Poder Paralelo" (2009) era exibida às 22h quando começou. Logo foi para 22h30, 23h, 23h15 e até 23h30 (alguns capítulos chegaram a terminar 0h30). Por mais que tenha sido boa - alçou Marcelo Serrado e Gabriel Braga Nunes de volta à Globo - não há quem fique "caçando" em que horário a produção vai ao ar (além do que muita gente levanta cedo para trabalhar no dia seguinte).
Esticamentos
Sem planejamento para substituir a tempo suas produções, o canal aumentava a duração das novelas, e a sensação do telespectador de ser enrolado era quase inevitável - "Ribeirão do Tempo", por exemplo, ficou 11 meses e meio no ar, tendo 250 capítulos entre maio de 2010 e maio de 2011. A fórmula do "Quem Matou" ou a inclusão de favelas e crimes estimulada pelo sucesso de "Vidas Opostas" (2006) viraram quase regra, cansando o público.
As trapalhadas mais recentes aconteceram com o sucesso de "Os Dez Mandamentos". A saga de Moisés foi esticada para aproveitar o crescimento na audiência e a fragilidade da estreia de "A Regra do Jogo". Com muita "água no feijão", a história bíblica enrolou o quanto pôde, com personagens levando eternos minutos para morrer e pragas do Egito uma semana no ar. Houve quem defendesse que a trama, finalizada em novembro, fosse ao ar até janeiro, mas a autora Vivian de Oliveira não tinha mais como enrolar tanto.
Improvisos
A substituta, "Escrava Mãe", estava pronta, mas a alta direção da Record preferiu engaveta-la, com medo de afugentar o público, e determinou que o horário de 20h30 seria apenas para histórias bíblicas. Criou-se aí um problema: a próxima, "A Terra Prometida", jamais ficaria pronta a tempo. E houve quem defendesse que deveria haver uma "ponte" entre o fim de "Os Dez Mandamentos" e o início da saga de Josué - que também não ficaria pronta em um prazo tão curto.
A solução adotada foi reprisar as minisséries bíblicas: "Rei Davi" (2012), "José do Egito" (2013) e "Sansão e Dalila" (2011), até que "Os Dez Mandamentos - Nova Temporada" fosse produzida. A continuação mostrou-se boa apenas no primeiro capítulo - que era na verdade como deveria ter acabado a trama original - transformando-se depois em uma espécie de "Malhação", onde o elenco ficava no deserto sem que nada relevante acontecesse, até que "A Terra Prometida" finalmente pudesse estrear, em julho deste ano.
Para "desovar" "Escrava Mãe", que já tinha sido totalmente gravada no ano passado, foi criado em maio um segundo horário de novelas, às 19h30. A continuidade dele, no entanto, dependeria do sucesso da obra de Gustavo Reiz - que vem marcando entre 10 e 12 pontos, índice que garante a vice-liderança para a emissora. Escolheu-se então a substituta, "Belaventura", que já deveria estar com uma frente de capítulos prontos, mas ainda segue na escalação de elenco. Como não dá para esticar a saga da mãe da escrava Isaura, a emissora vai apelar para a própria a fim de manter o público na espera.
"'Escrava Mãe' foi um experimento que o público recebeu muito bem. Há uma previsão de voltarmos com 'Escrava Isaura' na sequência", admitiu ao iG Anderson Souza, diretor-geral de dramaturgia da emissora. "Vamos estrear 'O Rico e Lázaro' (substituta de 'A Terra Prometida') no primeiro semestre e 'Belaventura' no fim do primeiro ou início do segundo semestre", completa.
As apostas de que "O Rico e Lázaro" não estreie a tempo de substituir "A Terra Prometida" é grande - há quem diga que só esteja pronta em maio, quando a previsão de término da atual é fevereiro. A Record já mostrou que seu problema não é espaço, mesmo com o Recnov terceirizado para a produtora Casablanca, que cuida dessas produções, mas sim planejamento, investimento e estratégia para fidelizar o público.
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