quinta-feira, 24 de maio de 2012

Avenida Brasil e o esqueleto de A Favorita


É praticamente unanimidade que Avenida Brasil é outro grande trabalho do autor João Emanuel Carneiro. Considerado ainda jovem na carreira, o novelista tornou-se a sensação dos últimos anos após engatar dois grandes sucessos no horário das 19 Horas - Da Cor do Pecado e Cobras e Lagartos - e entrar de forma meteórica para o seleto grupo dos autores do principal horário com A Favorita.

Em seu segundo trabalho neste horário, João Emanuel faz questão de criar um distanciamento saudável entre suas duas obras das 21 Horas. A Favorita sempre foi uma novela sombria, com grande carga dramática e com praticamente um único núcleo. Tudo girava em torno do épico embate entre as duas protagonistas Flora (Patrícia Pilar) e Donatela (Cláudia Raia). Avenida Brasil é muito mais colorida, com núcleos de humor espalhados pela trama e que sequer dialogam com o núcleo principal. Numa comparação rápida, a atual trama lembraria muito mais Cobras e Lagartos.

Porém, numa análise um pouco mais aprofundada percebe-se que não é bem assim. As semelhanças entre os dois produtos do autor no horário nobre não são poucas e, nestes últimos capítulos tornaram-se latentes. Recém-completados 50 capítulos, Avenida Brasil caminha para uma grande virada e todo o núcleo principal vai se contornando para este momento, tal qual ocorreu com A Favorita, quando, a esta altura do campeonato, a trama andava para revelar ao público quem era a verdadeira assassina de Marcelo.

Mas muito mais do que isso, ao comparar as duas obras, o personagem emblemático é Jorginho (Cauã Reymond). Nos últimos capítulos o personagem começou a descobrir uma série de fatos que, até então, passavam desapercebido por eles. Tudo começou quando ele descobriu quase por acaso que Nina (Débora Falabella) e Carminha (Adriana Esteves) já se conheciam. A partir daí, ele iniciou uma espécie de investigação para entender a situação e começou a descobrir inúmeras situações até chegar ao capítulo de ontem, quando descobriu que foi Carminha quem abandonou Nina no lixão. Nos próximos capítulos Jorginho ainda vai descobrir muito mais coisas.

Ao olhar para trás, situação idêntica ocorreu em A Favorita. Pouco depois do capítulo 40, a personagem Lara (Mariana Ximenes) passou a colocar em dúvida todo o amor que Donatela dizia sentir por ela e questionou quem dizia a verdade: a mãe de criação ou a mãe biológica. Também investigando, a personagem começou a descobrir situações estranhas, como o fato de Donatela dar presentes caros ao médico Salvatore, que cuidou do pai quando ele foi alvejado. Pouco depois, Lara também descobriu que a mãe de criação ajudava financeiramente a única testemunha do crime, Silene (Elisângela). Com isso, a conclusão óbvia era de que Donatela e não Flora havia matado o pai.

Jorginho é a Lara de Avenida Brasil. Os mesmos conflitos que a personagem de Mariana Ximenes viveu desde o início da trama repete-se agora. Jorginho é um personagem confuso, cheio de problemas e deslocado, exatamente como Lara era. Donatela queria se proteger de Flora que queria recuperar o que, segundo ela, lhe foi tirado e nenhuma das duas pensava em Lara. Nina quer se vingar de Carminha que, vilã, não deixa barato e nenhuma das duas pensam em Jorginho. Tal qual Lara se equivocou ao duvidar de Donatela, sabe-se que, nos próximos capítulos, Jorginho irá duvidar das intenções de Nina, apesar de desconfiar de Carminha, assim como Lara nunca confiou em Flora.

Dizer que Avenida Brasil não tem traços claros e bem pintados de A Favorita prova-se um engano. Assim como outros autores João Emanuel Carneiro utiliza elementos que o consagraram em seu trabalho anterior na tentativa de emplacar outro sucesso. A diferença, contudo, é que, ainda livre dos vícios por ser um autor mais jovem, com a ousadia que lhe é peculiar, o novelista mascara essas semelhanças e foge do óbvio, cria situações inusitadas e que prendem a atenção do telespectador. Inspirar-se em sua própria obra não é o problema, isso torna-se um erro quando há sinais de repetição por falta de criatividade. Não é o caso. Mesmo com elementos de A Favorita, Avenida Brasil mostra-se um mar de criatividade.
 

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